Com talvez 3 semanas, ou um mês de atraso, finalmente o verão carioca tem mostrado sua face típica. Dias de sol escaldante, bem úmidos, que assim prosseguem até as 6 da tarde: horário em que cai a chuvarada esperada da estação.
Eu acho curioso como, no meu histórico de vida, o verão se fez importante quase que sempre.
Quando muito novo, as chuvas de verão marcavam a proximidade das aulas. Pra mim, eram um lembrete de que eu conheceria pessoas novas, perderia velhos contatos, faria mais um pouco da minha vida nos semestres seguintes.
Criança ainda, mas com alguma consciência: lembro da separação dos meus pais e como vim parar aqui. E nessa época, eu fui apresentado ao medo irracional de chuva de boa parte da família. E isso, claro, incluía os cachorros. Porém, eu devo admitir que a casa sempre foi tão mal feita e estruturada que toda vez que bate uma chuva de verão os trovões próximos sacodem as paredes. Deve ter sido aí que passei a respeitar a natureza.
E daí, conforme o tempo foi passando, o padrão se manteve: as chuvas de verão marcaram novos começos, desilusões amorosas, o primeiro famigerado "eu te amo" que recebi, a conquista de alguns objetivos, etc etc. Em especial, as famosas águas de março batem com a maior parte desses eventos.
Ultimamente, quando a tempestade chega, eu me lembro desses eventos. Cada raio que vejo cair me lembra de algum deles, sem uma ordem ou preferência específica de lembrança.
Comecei a pensar em como as memórias são comparáveis aos relâmpagos em velocidade e impacto.
Quer dizer. Toda lembrança que temos é resultado de sinapses, né? Estamos falando de eletricidade dentro da gente, a começar por aí.
Mas o meu ponto é um pouco mais lúdico. E também, mais pessoal. Sendo assim, eu não espero que outros entendam exatamente o que quero dizer.
Enfim, a questão é que quando eu lembro desses episódios, eu penso em algo maior que em uma memória. Eu entendo a memória como uma vida que já foi. Ao menos, na linha em que vivo.
Como se cada raio, veloz como o pensamento, me trouxesse a vida do momento que acabei por lembrar. E não como uma lembrança somente, mas como a sensação viva de pensar outros desdobramentos. Outros pontos de escape da eletricidade, e possíveis consequências.
É bem louco, mas essa energia renovadora das tempestades tanto me propõe a imaginação do que poderia ter sido como do que pode ser agora. Talvez por isso as renovações baterem com essa estação.
Anyway, lá vem chuva. Vamos ver o que virá.
Recado de Beto Guedes
Há 3 anos