No meio do tédio desses dias, em que eu me coloco evitando deveres acadêmicos e também evitando a fadiga de atividades que ruem assim que planejadas ou que não me motivam tanto, deitei-me na cama e deixei os pensamentos fluírem.
Muitas coisas brotavam sozinhas. Vai ver é por isso que guardamos bem a informação que memorizamos antes de dormir. Há algo no relaxamento e abstração total que liberta nossa capacidade intelectual e criativa.
E deste algo, me brotou o seguinte questionamento:
E se de repente fosse o fim do mundo?
Se, por algum motivo, não importando qual (meteoro gigantesco se aproximando, implosão do núcleo terrestre, apocalipse zumbi), a vida na Terra estivesse fadada à extinção?
Sei que é meio bizarro, e até sem sentido. Mas sei lá, simplesmente foi algo que me bateu.
O que será que as pessoas fariam?
Não é muito difícil imaginar. Sendo otimista, pelo menos 90% do planeta entraria em frenesi. Saques, migrações em massa desesperadas (se houvesse uma chance de salvação relativa à localidade), violência generalizada nesses atos e em outros como desobediência civil, pânico e suicídio coletivo. Não ia importar muito a classe social ou orientação religiosa, o caos seria uma lei no tempo restante. É como se as pessoas não assistissem filmes de ficção científica, ou não prestassem atenção caso o fizessem. Replicam o mesmo comportamento inútil.
Vamos, seriamente, pensar que tal hipótese - fim do mundo - é um fato constatado para um futuro qualquer. Então, uma coisa deve ser imposta, antes de qualquer planejamento de ato para aproveitar o tempo restante de vida.
Nada que possa ser feito impede o fim do mundo, portanto, quanto mais rápida a aceitação, mais fácil será o que vem até o momento derradeiro.
O pânico e o frenesi citados mais acima são justamente o que levam à humanidade a findar mais rápido, em qualquer cenário imaginável. Não seriam necessários metade dos zumbis estimados, nem que ET's precisassem fazer algo mais do que simplesmente aparecer. A humanidade é tão desmiolada e de psicológico fraco que ao primeiro sinal de problema o desespero é rei. Daí começam os sensos de sobrevivência individualista, acirrando as já existentes desigualdades e preconceitos. Se ainda houvesse chance de sobrevivência ante à ameaça que fosse, esta chance se perderia pra toda a humanidade, dado que 90% dela comprometeria o sucesso da espécie por sua própria natureza imbecilizada.
Ou seja, se houver chance de sobreviver, a melhor ideia possível num primeiro momento é a de se acalmar. Não é que manter a ordem social seja importante, não, nada disso! Toda e qualquer estrutura social pode ser reconstruída ou melhorada após a garantia de sobrevivência. A questão é que é mais negócio deixar que o 90% se mate sozinho e esperar que isso aconteça isolado, escondido. Sejamos francos, se é pra espécie continuar, claramente não é proveitoso passar o gene do pânico para gerações futuras. E tentar estabelecer ordem no caos é inútil. Essas pessoas se destruiriam sozinhas ou se expondo ao perigo iminente com ou sem orientação de quem conseguisse entender a importância da sobrevivência como coletivo. E esse é o primeiro paradoxo ao qual um sobrevivente deve se adaptar: para que haja algum coletivo no futuro, não se deve tentar impedir o fim da maior parte do coletivo presente. Basta pensar um pouco. Se você quer sobreviver, e pode (tentar) garantir a sobrevivência de mais algumas pessoas ao seu redor, tentar salvar todo e qualquer ser humano no seu raio de alcance provavelmente vai arruinar a todos de uma vez.
Enfim. Aprendido isso, vêm a segunda lição: abrigue-se e espere pra ver no que dá.
Não adianta tentar resolver tudo sozinho: militares e governos se matarão tentando vencer a ameaça que for. Se por acaso não o podem, não vai ser um civil que o fará. Portanto, ficar dando uma de herói quando não é estritamente necessário só vai acelerar o seu próprio fim. Vai que você, escondido, sobrevive com quem mais você arrastou?
Pois bem. Era isso que ficou na minha cabeça.
Acho que o único desespero que eu teria, nessa situação hipotética, seria de salvar as pessoas mais próximas. Mas constatando a impossibilidade em todos os casos que me chamariam a atenção, seguiria em frente. Pois essa é a lição final: você só lamenta a perda das pessoas que ama após conseguir sobreviver, pois se parar pra isso vai junto delas.
E talvez isso seja parte do que poderia me matar. Será que eu aguentaria pra lamentar depois ou deixaria pra me levarem junto?
Vai saber. Viagens do tédio.
Recado de Beto Guedes
Há 3 anos